Era
de manhã quando chegamos à Estação de Sáo Bento, a névoa gélida de janeiro
fazia seu papel. E os humores do inverno a seguiam. Fomos andando até a
escadaria que dá pra rua, e lá pegamos um táxi. As malas que traziam de Lisboa
fotos, livros e a saudade dos dias mais quentes do sul pesavam que nem chumbo.
Ele
entrou primeiro no táxi, me deixou a colocar as malas no bagageiro. E ao passo
que eu sentia raiva, sabia dos humores invernais. Era ano após ano.
A
dor trazia aos seus ossos a lembrança de que a temperaturas abaixo dos 20 graus
é angústia de ex-combatente.
Guerra
na África? Não, jamais poderia lutar pelo que nunca acreditara. O que lhe havia
de ser dito sobre a Nação nunca fizera lá muito sentido. Era um porquê mal arrumado
criado por fazedores de notícia que jamais saiam de suas casas intelectuais
para o que havia de ser vida. E seus ossos sabiam bem.
O
combate de uma guerra imaginária, que resultaria em banqueiros anarquistas,
como aquele que teria sido amigo de Pessoa.
O
queixume de seus ossos o faziam odiar o que tinha restado de guerra. A luta por
banqueiros anarquistas tinha sido inútil. E ele lembrou de um memorial montado
para as vidraças que morreram na guerra.
Lembrou
das suas amigas portuguesas mais queridas, As Pedras, que haviam se refugiado
no Uruguai. As poucas que sobraram após incontáveis perseguições.
Entrei
no táxi. E ele chorava. O que passa contigo? – perguntei.
E
ele, com o olhar perdido pelos transeuntes bêbados, respondeu:
Penso
em Jesus Cristo. As lutas por mais que o tentassem dignificar, nunca tentaram
desprega-lo da cruz do calvário.
Não
entendi, de primeiro, da onde teria surgido Jesus naquela manhã saudosa em que
provavelmente voltaríamos para o lugar que nos vimos pela primeira vez. Ele
nunca havia falado de Jesus Cristo.
Mas
continuou – Tenho pena de vê-lo tão paciente esperando que alguém o salve.
Então
chegamos na ladeira de Campanhã, onde havíamos nos visto pela primeira vez. E
ele, ainda com os olhos d’água, me olhou e disse: o que há de ser inverno senão um
intervalo para que meus ossos pararem de reclamar da dor.
E
não pensa em flores?
Não,
elas ficaram todas com os banqueiros.
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