quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Amor além da vida


Eu acordei e você estava do meu lado. De cabeça pra baixo no sofá cama que dividíamos para passar noites assistindo a videos idiotas no youtube. Você tava com aquele olhar de quem queria falar alguma coisa, mas não sabia como começar. Você não falou nada. Eu chorei em silêncio. Eu te via, te sentia. E você estava ali, com a coberta que você roubara de mim.

Era um sonho. Você não poderia estar ali. E estava. Apenas me olhando e sorrindo como se estivesse zoando alguém. Coisas que só nós entenderíamos. Eu rezei pra te ver. Queria me despedir, me desculpar. Eu precisava te contar dos homens que beijei, das bebidas que provei, dos filmes que assisti. Eu queria um dia, um minuto que fosse. O teu abraço. A tua risada. A sua alegria constante.

Fiquei com medo de piscar e você sumir. De te perder pra sempre mais uma vez. E eu sinto tanta a tua falta. Eu não queria ver você partir. Ver o meu mundo se despedaçar. Queria te contar que embora as pessoas não entendessem, eu te entendia. E te amava do jeito que você era. Completo. Imperfeito. Maravilhoso.

Eu queria o meu irmão de volta. O pedaço da minha vida que Deus arrancou de mim sem a menor consideração. Eu queria nossas músicas e nossas brigas. E o teu companheirismo incondicional. A admiração mútua que sentíamos um pelo outro. Queria pelo menos mais um minuto das nossas bobeiras e da nossa incompreensão com o mundo.

Você foi embora e eu não consigo desistir de te querer de volta. As vezes eu não entendo como todo mundo pode viver sem você e eu vivo nessa dor que beira o insuportável. Eu só queria por um minuto matar essa saudade que me machuca a cada momento. Do jeito que eu te conheço, e do jeito que você me olha nesse sonho, aposto que diria: Deixa, a vida é assim mesmo. E me falaria uma coisa idiota que me faria rir.

Te peço pra que fique nesse sofá cama comigo, um pouco mais. Preciso ao menos do teu olhar irreal. Da tua sombra. De qualquer coisa que não te deixe morrer em mim. Me perdoe o egoísmo. Não me acorde. Não vá.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Temporada das Flores



Era uma tarde escura do mês de setembro. O mês que os humores melhoram, que o calor começa a aparecer, e as alergias também. Chovia. E eu escutava as gotas baterem nas telhas. Não ventava. E não haviam carros nas ruas. Era apenas o barulho da chuva que caía em notas musicais. Como uma sinfonia, ela falava sem dizer.

Essas tardes chuvosas trazem as lembranças tristes que nós guardamos para julho e agosto. Mas setembro, não. Setembro é o mês de esperar. É o mês que termina o ano, que começam a montar a árvore da Lagoa, e surgem os papos de reveillon ou carnaval. Só que mesmo assim a chuva trouxe todas as lembranças que só são bem vindas com uma boa taça de vinho. Era inverno, mesmo que a primavera já quisesse chegar. E quem é feliz no inverno?

A chuva é fria, fina. Erudita. Nada das batucadas que só os trovões sabem fazer. E já passou o tempo dela. Chegou a hora de esperar. De reclamar do calor, e querer ir a praia todos os dias. Chegou a horas das flores, das tardes de sol a pino. Dos sorrisos e das noites frescas. Dos chinelos. Das lembranças darem lugar às esperanças.

Chega logo Primavera, esse inverno tá me matando.

domingo, 11 de setembro de 2011

Não ser.



Eu parei sem perceber que tinha parado. O lugar era novo. Estranho. Quente. Esperei um pouco. Até que comecei a pensar coisas sem sentido. Era cedo e eu não precisava ser. Era o mar na minha frente. Que não era. Assim como eu não precisava ser. Era um sonho lindo. Ou era a primeira vez que a realidade sorria pra mim. Eu parei e sabia que tinha parado.

Não sei dizer o que via. Mas era bonito. Acho que me vi, talvez. Ou o mar. Não sei. Sentia que precisava me mexer. Mas não queria. Se eu me mexesse eu seria novamente. Precisava não ser por um tempo. E já não era mais cedo. A maré já tinha subido e molhava os meu pés. Não me mexerei. As ondas me escutaram e batiam suavemente no meu tornozelo.

Ainda preciso não ser. Pelo menos mais um pouco. Eu não disse uma palavra enquanto estive parada. Mas me escutaram como se pela primeira vez eu fosse reconhecida como um ser. Eu sou, novamente. Não sei o que. Então, me mexi porque já era. O sonho terminaria. A realidade não iria mais sorrir.

Caminhei mais um pouco com vontade de parar mais um vez. Não podia. Já era tarde. O céu se pintara de rosa, lilás e vermelho. E eu sabia que o negro viria iluminado pelo prata. O céu sempre fora. Eu não. O sol queria dormir. A lua acordar. E eu só queria parar. Só mais um pouco. Esperem, não durma. Não acorde. E de repente nem um, nem outro se encontrava no céu. Eles também pararam.

Enquanto todas aqueles tons iluminavam a água e não se via astro nenhum. Eu decidir parar. E tentar não ser novamente. Mas era rápido demais. Eu parei, eu quando quase não era, voltei a ser. Já era noite. E eu precisava ir. Ser.


Foto: Julia Maria - Pipa, RN

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Todos nós herdamos no sangue lusitano uma boa dose de lirismo

Senta-te, pegue tua guitarra e meu porto. Que hoje cantaremos um fado.




As ruas de Lisboa cheiram a ti. Tem teu gosto e toda a gente sabe que meu canto tem teu nome. Tu te banhaste no meu Tejo e contaminaste a minha cidade, a minha alma.
Posso te olhar neste céu estrelado, e cá pertinho a brisa que vem do mar e sobe a ladeira congela meu rosto. És tu, amor meu, que atravessa mares para encontrar esta rapariga que canta a te esperar.

Sabes que meus sentimentos estão guardados num cantinho de areia em frente ao porto que irás chegar. Tu os pegará, há de aquecê-los do frio, e os trará de volta para mim.
Ah Marinheiro, como pudeste partir? Como um lusíada de uma história sem sentido tu roubaste tudo o que há em mim. Este mar, este céu, esta lua, estas ruas, este vinho, amor meu, tu levaste o sentido de tudo.

O vento castiga meu coração, as ondas o afogam minuto após minuto. Recuso-me a sair daqui. Espero-te, Andarilho dos Sete Mares. Mares que desejo, ardente, frio, azul, profundo.
Entras pelo meu Tejo, meu Marinheiro. Chega-te a tua cidade, a tua amada.

Amargura-me tua ausência, e amargura maior é a tua presença em tudo o que amo de minha terra lusitana. Choro ao cantar este fado, onde todas as notas são ondas deste mar em que navegas, onde cada palavra é teu nome. E quando Lisboa silencia, rio. Ao escutar ondas mais fortes, alucinar a tua imagem vinda no teu veleiro. Chegando junto a mim.

Pare a guitarra. Acabou o porto. Levanta-te.